Lamento profundamente a dor dos envolvidos. Fico triste e chocado com a brutalidade em que alguns eventos tem lugar na nossa vida. Encontro-me solidários as famílias que tão tristemente perderam seus entes queridos em situações que nunca serão completamente superadas.
Contudo, me incomoda a repercussão seletiva dos casos.
Ficamos todos tristes com a queda do avião da NOAR que vitimou 16 pessoas em Recife. A tristeza torna-se absurda ao observar uma série de indícios de má conservação das aeronaves, supondo que tudo poderia ter sido evitado.
E ficamos indignados com a morte da advogada paulista, vítima de abalroamento por um Porsche na madrugada. E a indignação aumenta ao observar o comportamento indigno do motorista ao ignorar solenemente a vida que se esvaía no carro ao lado por responsabilidade também dele, que tinha sinais de embriaguez e trafegava em altíssima velocidade numa área urbana.
Mas não é só isso. Porque estamos tristes por todo Brasil com esses dois casos e ignoramos ou desconhecemos a avalanche de casos que ocorrem em nossas cidades todos os dias?
Eu moro próximo da avenida que possui maior números de acidentes no meu estado. É uma rodovia, melhor dizendo, onde morrem pessoas com espantosa frequência. Todos os dias vejo acidentes com carros, motos e bicicletas. Todo dia no caminho para o trabalho, sem exceção. A gravidade varia, mas alguns casos terminam em mortes.
Eu acredito que o único motivo para nos solidarizarmos com essas vítimas de maneira prolongada e não o fazermos com as pessoas que morrem próximas a nós é porque os dois casos citados ocorreram com pessoas ricas, em sua maioria.
Só anda de avião quem participa do Brasil oficial, que tem uma vida confortável, mesmo que não tenham muitas posses, são pessoas que ganham bem mais que um salário mínimo. É fácil para nossa elite comover-se e identificar-se com essas vítimas. E no caso do trânsito, todos os envolvidos possuem condições econômicas muito superiores a maioria da população. A grande imprensa presta seu tributo aos seus pares, noticiando seguidamente os casos onde a elite se reconhece.
Sinto-me solidário também àqueles operários que por necessidade andam de bicicleta em nossas ruas e que morrem diariamente sem que jornais e televisores de todo o Brasil tomem conhecimento. Esses cadáveres anônimos ao grande público, pobres em maioria, não tocam ninguém além de suas famílias, e por isso ninguém preocupa-se de melhorar nosso trânsito.
No choque entre a elite e a massa, morrem os pardos e nada muda.